quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

AUTO-IDENTIDADE E AFIRMAÇÃO. Texto de Marcelo Silles

O Movimento Negro não é para todos os negros. Ele se divide em vertentes, ideologias, diferentes propósitos e grupos:

1) Os Pretos na diáspora, afrocentrados, afrodescentes/brasileiros (na qual faço parte);
2) Os negros afrobrasileiros;
3) Os jabuticabas (ignorantes e amantes das correntes que os prendem), simpatizantes do humanismo, mulatismo, morenismo, pardismo;
4) Os los macaquitos (ignorantes e amantes das correntes que os prendem e adeptos do midiático discurso alienado "somos todos macacos" ), o mais novo, que não existe racismo, que o racismo está na cabeça dos dois grupos ácima;
5) E os mais claros(negros, jabuticabas e los macaquitos) da classe média que se acham elite branca e odeiam e detestam os pretos, e também ignorantes e amantes das correntes que os prendem.

Pode se dizer que o Movimento Negro teve início com os quilombos nas lutas de resistência, onde o mais famoso foi o Palmares comandado por Zumbi. Luta de resistência que perdura até hoje. Vale destacar também em Montaño e Durighetto que “no Brasil as primeiras expressões do Movimento Negro podem ser identificadas no final do século XIX, período em que já circulavam vários jornais voltados para a população negra com o objetivo de denunciar a discriminação racial. Os textos reivindicavam integração e participação na sociedade e a educação como meio de ascensão social.” (pág. 282).

O Movimento Negro Nacional tem sua história marcada por rupturas e fragmentações, por conta da destruição e da identidade do povo negro pela minoria branca dominante. Essa ação teve e tem o objetivo de desarticular e desmobilizar qualquer ação conscientizadora de cidadania e política.  Por existir divisões, correntes de diferentes seguimentos dentro do próprio movimento, se torna inviável uma união em prol de uma única causa, de uma ideologia. Fragmentações surgem de todos os lados.  Pode-se até mesmo afirmar, de acordo com Honneth, que se cria um ambiente de concorrência dentro do próprio movimento, por não haver familiarização dos próprios com a ideologia do movimento como também de uma pequena participação da maioria da população negra. Entre os próprios indivíduos de cor, há uma impressão generalizada de que é difícil levar a população negra a manifestações de solidariedade e de que, em geral, quando um preto sobe socialmente, ele se desinteressa pela sorte de seus companheiros de cor, chegando a mesmo negar, com frequência, a existência de preconceito e desse modo, desvirtualizando a luta e valorização da causa do movimento. E além do mais citando Lavalle, Castello e Bichir “... a despeitos desses atores terem ocupado posição privilegiada...” (pág.2), atores esses de destaque dentro do Movimento.

O antagonismo correntista e a disputa de interesses se somam ao difícil processo de ressignificação da identidade negra. O embranquecimento foi um processo eficaz política e ideologicamente aplicado pela minoria dominante para manter o seu pólo de dominação. Abordar as principais problemáticas que envolvem a condição do negro no pais, se tornou algo mitológico. Montaño e Durighetto citam em seu texto que existem duas vertentes do Movimento Negro no Brasil, de cunho político-ideológico e interventivas as quais citam: uma que prioriza a conquista de poder político-institucional e outra que prioriza a ampliação da base social do movimento. Essa última visando o “fortalecimento das entidades e de suas articulações internas.” (pág. 284). É de fato que, a discussão dessas duas vertentes é acirrada e desmobilizadora da causa coletiva, criando assim um ambiente de disputa dentro do movimento propício para status, privilégios e conquistas particulares. Os autores ainda citam as ideologias que definem a existência dessas duas vertentes onde um setor defende “uma luta antirracismo desvinculada da questão de classe, por acreditarem que a questão racial, e não a de classe é o elemento determinante para a inserção e ascensão social dos sujeitos, e por outro, os que argumentam que, no capitalismo, a situação de classe interfere diretamente nas questões raciais.” (pág. 284). Observa-se que há uma defesa da teoria marxista na segunda vertente.

Anos de lutas e mobilizações, firmaram o Movimento Negro no contexto das lutas populares, com participação acirrada na luta contra o racismo e a exclusão do negro. Com isso deu-se uma visibilidade e com isso entendeu-se “que a luta contra o racismo representava precondição para a redemocratização, assinalando a necessidade de sua incorporação nos programas partidários.” ( MONTAÑO e DURIGHETTO pág. 283). O ambiente de aparente calma e consolidação das lutas contra o racismo e a exclusão do negro, edificou um sentimento de conformismo em frente a política de “democracia racial” pregada pela mídia veiculada. Os novos atores sociais, sentem a dificuldade em recrutar novos membros e convocar os negros que não estão engajados na luta para participar e integrar essa mobilização em prol da luta do negro. Muitos não aceitam que existe racismo, quo próprio negro com esse viés de luta, fomenta o racismo.

No Brasil ainda se configura o que podemos chamar de “democracia racial”, visto que de tanto sabatinarem a harmonia entre as raças, ficou concretizado no cotidiano brasileiro que não existe racismo, não existe preconceito e muito menos uma segregação. O povo afrodescendente vive uma leitura estreita de identidade e pertencimento, por causa de estereótipos construídos e naturalizados pelas palavras compostas com intenções maléficas, que com isso vão-se permitindo a centralização da hegemonia eurocêntrica no poder. O discurso ideológico da ascensão social pelo esforço pessoal é mais um elemento a contribuir irremediavelmente para a intolerância e a segregação e a desarticulação do Movimento Negro. Afinal de contas, seguindo a lógica desse discurso, o pobre é pobre porque quer, e a inferiorização social de negros, é culpa deles próprios.

Na própria entrevista que fizemos com um dos membros da Fundação Zumbi dos Palmares, o mesmo deixa claro a sua posição de que vivemos numa nação mestiça, de democracia racial. Podemos observar, através da entrevista realizada com esse membro, que na real a fundação se apresenta mais como uma proposta campanhista do que articulada à luta do movimento negro. Como diz Montaño e Duriguetto “mobilizações que partem de um chamamento à consciência individual das pessoas e elas, usualmente, têm se apresentado mais como “campanhas” do que como movimentos sociais.” (pág. 304).

Mas não se pode negar as lutas e conquistas alcançada pelo Movimento Negro. A mais atual conquista o Estatuto da Igualdade Racial, se concretizou num período de muitas lutas. O Estatuto da Igualdade Racial é uma importante ferramenta de defesa do negro. É nele que está contido as Leis, Artigos, Diretrizes que garantem ao negro os seus direitos perante a sociedade brasileira racista e excludente. É no Estatuto que está implementado a Lei das Cotas, garantindo aos afro-brasileiros uma porcentagem não só na educação pública como também nas áreas de trabalho. O Estatuto garanti direitos fundamentais aos afro-brasileiros. Como afirma o relator da formatação do Estatuto da Igualdade Racial, o Senador Paulo Paim “é defender os que são discriminados por etnia, raça ou por cor é fomentar o debate contra o preconceito racial tão presente em nosso país”. Essa é apenas uma de muitas conquistas a qual o Movimento Negro, representado na pessoa do Senador Paulo Paim obteve nesses anos, há muitas outras conquistas importantes e muito a se conquistar.
Att,

Marcelo Silles
Assistente Social com Bacharel da Universidade Federal Fluminense/UFF-RJ

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