sexta-feira, 26 de julho de 2013

O ELEMENTO NEGRO. REFLEXÃO.

MARCELO SILLES
ASSISTENTE SOCIAL(BACHAREL DA UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE/RJ) E RAPPER.


Quem contribuiu para o florescimento, crescimento e desenvolvimento dessas terras e que não tem o seu devido valor na história deste município e sequer é lembrado em suas manifestações e festas? O elemento negro. Quem de fato serviu com entusiasmo os seus senhores sempre com o “sim senhor” e “não senhor” e se quer tem um obrigado aclamado em sua memória por ter se dedicado com tanta afeição e amor por essa terra? O elemento negro.  Elemento Negro, adjetivo cunhado no livro de Ana Maria Teixeira (HISTÓRIA DE BOM JESUS DO ITABAPOANA. UFF.EDUFF. 3ª EDIÇÃO AMPLIADA. 2005) que conta a história do município de Bom Jesus do Itabapoana. Mas uma pergunta soa no ar: porque referir-se ao preto como elemento? No livro destacam-se as referidas palavras “introduziram o elemento negro”, como se o negro fosse algo, alguma coisa de uma devida importância um tanto material e não visto como um ser humano, cidadão, indivíduo que contribuiu para o desenvolvimento e crescimento da cidade de Bom Jesus do Itabapoana.
De certo que não devemos julgar épocas passadas as contemporâneas, mas porque isso aplica-se somente aos pretos e índios e não aos europeus? Os descendentes eurocêntricos sempre adoram lembrar que seus ancestrais contribuíram e muito para o desenvolvimento e crescimento destas terras, adoram falar de seus feitos. E o negro, como foi trazido à força para essa região sob o status de escravizado, inferior e sub-inferior nada vale ser lembrado a respeito de seus feitos a não ser quando o mesmo aceite as mesmas condições históricas construídas sob sua condição “sim senhor” e “não senhor”. A condição servil forçada somada a caridade e o paternalismo-assistencialista transformaram o negro num ser subserviente e pactuante de sua condicionalidade dócil de serviçal a alegre como tudo está bom. Apontar àqueles que colaboraram de certo modo para a manutenção dessa condição é tida como algo que se for buscada a fundo, como retrograda e uma discussão atrasada, fato que estamos caminhando para um futuro, que assim afirmam, promissor e de igualdade universal para todos. Portanto, reabrir discussões e trazer a tona ranços passados atrapalham o desenvolvimento. Ou seja, a verdade dói.
Quem vem de fora percebe uma cidade com traços eurocêntricos, os negros estão nas periferias, margeados. Desde sua fundação a política de segregamento sutil, teve sua aplicabilidade com total benção e colaboração por parte da gigantesca população negra bom-jesuense desde seus primórdios. A consciência de negritude, cultura e ancestralidade nunca foi cultuada entre os pretos e pretas bom-jesuenses, portanto, a docilidade e subserviência entre seus senhores, a prática cotidiana do “sim senhor” e “não senhor” transformaram-se em um ritual abençoado e pactuado. Aquele preto que reconhece a sua ancestralidade e seu valor na sociedade é rapidamente excluído e desmoralizado entre os seus irmãos. É taxado de racialista e um indivíduo que atenta contra a moral e os bons costumes de nossa boa e pacata cidade.
Portanto a denominação de “elemento negro” batizada por Teixeira nos deixa a entender o motivo dessa alcunha. Tratar o negro como “elemento” e referenciar-se ao negro dessa forma é a forma mais clara e cabal de racismo sutil e velado criado pelos tais “senhores” e percebido sutilmente em nosso cotidiano diariamente. Nos tratamentos dados, nos cargos e funções, nas ascensões sociais e econômicas e na própria postura do negro em sua aceitação social e econômica.  A criminalização do ser negro, por sua cor não é novidade em nossa sociedade. Pelas fotos históricas podemos contar nos dedos quantos negros e negras constam nelas. Números ínfimos.
Analisando criticamente o passado bom-jesuense consta uma total desvalorização proposital da exclusão do negro em seu valor histórico, cultural e econômico para o desenvolvimento da cidade. O negro nunca teve o seu espaço reconhecido, no entanto, é sempre requisitado em épocas que favoreçam as famílias dos tais e os tais “cidadãos de bem” de Bom Jesus. Doravante os atributos do preto e da preta serviçal são bem quistos pelos mesmos e pelos tais “cidadãos de bem” de Bom Jesus. Ver um preto em ascensão é algo aterrador para muitos, como sempre já ouvi piadas e comentários bom-jesuenses racistas do tipo: que neguinho marrento só porque passou num concurso; é isso que dá, da asas a macaco só porque está de farda; lugar de preto é na faxina. Estes são apenas alguns dos adjetivos que os tais “cidadãos de bem” de Bom Jesus elogiam os pretos.
E esse tal de “neguin”, neguim pra cá, neguim pra lá e muitos dizem “é algum comum é cultural, não estamos falando dos negros mais de todos”. Mas só que esse adjetivo, que de nada tem em elogio, somente é aplicado quando se refere ao indivíduo que faz algo de ruim, péssimo e novamente entra a questão que de tudo relacionado ao termo negro é ruim: não pode deixar assim porque se não neguim invade; rapaz toma cuidado porque tem neguim muito doido por lá. E por aí vai. Agora me digam, tem ou não tem algum sentido e conotação racista neste termo coloquial neguim?
Várias são as desculpas esfarrapadas, assim sendo no livro que basicamente conta história oficial do município de Bom Jesus do Itabapoana-RJ, o negro tem o seu referencial marcado como um “elemento” e nada mais do que isso. Uma triste realidade histórica de nossa região onde muitos ditos os tais “cidadãos de bem” amam em conclamar o seu retorno histórico triunfal da qual a mesma foi um dia.

Rapper Marcelo Silles


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