terça-feira, 13 de agosto de 2013

PARTICULARIDADES: E OS NEGUIM!

MARCELO SILLES
ASSISTENTE SOCIAL COM BACHAREL DA UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE-UFF/RJ & RAPPER.

As particularidades minuciosas encontradas em nosso cotidiano nos fazem crer que o sentimento saudosista de uma época em que os descendentes dos colonos que gozavam de totais privilégios, apesar de ainda estarem gozando, reforçam ainda mais o clamor de um retorno ao passado do tipo “onde todos sabiam o seu lugar”. Escutei de um senhor que viveu segundo ele, na melhor época de Bom Jesus do Itabapoana-RJ, quando se começou a limpar a beira-rio na gestão do tal ilustre prefeito da época Carlos Garcia. Detalhem bem o que foi dito por esse nobre senhor da classe do “bem”: começou a limpar a beira-rio. Indaguei-o sobre o que significava essa limpeza e o mesmo havia dito que: “tirou a zona, toda a sem-vergonhice e imundice da beira-rio e de Bom Jesus”.

De forma autoritária ele foi despejando todo o seu preconceito, discriminação e racismo. Disse que havia conhecido uma empregada negra, mas tinha uma alma branca. Questionei-o sobre o que significava negra de alma branca, apesar de que bem sabia o que era, e ele disse: uma pessoa boa, de boa moral. E eu respondi: o senhor acaba de praticar um racismo. E ele nervoso disse: não, nunca fui e não sou racista sempre fui uma pessoa de bem. Essas tais pessoas de bem sempre me incomodam. A discussão prolongou com o trágico final do dito senhor de “bem” virando as costas e saindo com seus argumentos fracos carregados de preconceitos, discriminações e racismos.

E o tal neguim, aaahhhhhh os neguim, as pessoas de “bem” adoram os neguim, “oh feche isso se não neguim invade”, “a festa rolava tranquila ate neguim começar com a baderna”, “não vou não, porque neguim vai começar encher a cara e arrumar confusão”. E o tal negão qualquer preto é negão, mas experimenta chamar todos os brancos de brancão ou de branquelo pra você ver a confusão que irá criar rapidinho.

São essas particularidades cotidianas que ao observarmos detectamos claramente o racismo e suas verbalizações em que os indivíduos ofendidos por não terem essa sensibilidade acabam reproduzindo. A mistura sanguínea sempre foi e ainda continua sendo umas das desculpas mais esfarrapadas dadas por aqueles que praticam o racismo de forma velada e intencional. O branco por mais que se doutore na cultura e história das Raízes africanas, nunca será um preto, nunca ira sentir na pele as nossas aflições, conflitos, nunca saberá o que é negar suas identidades, ancestralidades, o devir negro e sentir a alma africana. O preto sabe tudo do branco anseia por ser um branco, pois quando nasce já é batizado com um nome branco, sendo criado numa cultura totalmente branca e marginaliza seus próprios irmãos por culpar-se de ter nascido negro.

Moral da história: Estado e sociedade inerte com um racismo institucional que tentam velar.

POVO CHIQUE

MARCELO SILLES
ASSISTENTE SOCIAL COM BACHAREL DA UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE-UFF/RJ & RAPPER

Certo dia uma pessoa comentou com minha pessoa que a tal festa de São Pedro do Itabapoana, é muito boa, melhor festa da região porque somente vão a essa festa pessoas “chiques”, pessoas “bonitas” você não vê gente feia. Questionei-me a mim mesmo, o que seria essa gente feia?

A pessoa que comentastes comigo tem o perfil padrão elite-classe média faz parte do tipo que se incomoda com moradores da Volta da Areia, Usina Santa Isabel, Nova Bom Jesus, Asa Branca, Morro do Querosene e demais localidades com pontuações periféricas. Pessoas como a tal, percebam que coloquei no feminino, não suportam estarem no mesmo lugar com pessoas que a tal classifica como favelados, barraqueiros, marginais. Portanto, padrão bom-jesuense das ditas “pessoas de bem”, conservadoras, oligárquicas, assistencialistas, paternalistas.

Essas tais festas que a tal relatou são de perfis sertanejos e forrós universitários, onde habitualmente os indivíduos que as frequentam fazem questão de expressarem suas raízes claro-eurocêntricas. O padrão branco é totalmente visível, tanto os homens como as mulheres têm as cútis branca ou clara, é raro vê pretos ou pretas nessas festas. Quando os encontram, ficam as margens longe dos holofotes que procuram somente as pessoas bonitas, ou seja, preto não é bonito. Infelizmente isso está acontecendo com o nosso samba e pagode. Bom as pessoas de “bem” podem entrar numa boa em nossos meios, enquanto nós não podemos sequer frequentar os seus ambientes sem sermos tachados de marginais, barraqueiros ou melhor que estamos incomodando ou enfeando a festa.
Retornando ao assunto da tal festa de gente bonita de São Pedro do Itabapoana, na qual analiso como um encontro de tribo que se auto-declara verdadeiros senhores e senhoras dessas terras e ainda a serem bajulados e adorados por aqueles que eles classificam indiretamente como “seres inferiores”. Bem se é uma festa bonita onde predomina indivíduos brancos ou de peles mais claras, deduz-se que pretos e pretas não sejam pessoas bonitas para os tais.

Comentários com cunhos de promover o racismo e o segregacionismo são comuns em Bom Jesus do Itabapoana/RJ e Bom Jesus do Norte/ES. As “pessoas de bem” carregam o ranço de dividirem espaço com pessoas que em seus círculos os mesmos os classificam de indesejáveis. O cotidiano da sociedade bom-jesuense é esse.


Portanto, deixo uma análise crítica do que é o ser bonito e o ser feio. O padrão beleza e o padrão feio. Não adianta justificarem com questões tipo “você está vendo coisas e colocando na sua cabeça”, “vocês que estão sendo complexados”, porque o racismo brasileiro velado é praticado dessa forma, com verbalizações subliminares.