quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

MORENINHA OU NEGRA? - Texto de Nadia Amorim


Recentemente, ouvi de um colega de trabalho, a senhora é morena. Eu disse, sou negra, não existe a etnia morena. Aí...como sempre, veio aquele comentário infame: Eu falei morena, porque eu não queria ofender a senhora...(rsrs) >>>A questão de assumir-se como afrodescendente não é meramente científica, mas politico e ideológica, é importante que assumamos nossa identidade, até então negada pela cultura eurocêntrica. Aprendemos na escola que somos o resultado da mistura de índios, negros e europeus, mas curiosamente, só temos acesso à cultura européia. Cadê a cultura dos povos originários (denominados pejorativamente pelos europeus de índios)? Cadê a o conhecimento da cultura africana ( que há 10 anos virou lei, mas até hoje não é conteúdo dos concursos oficiais e nem das aulas de história do Brasil)? Muitos professores ignoram que o Egito é na África. Somos a diáspora africana e precisamos nos assumir com tal, promovendo o resgate da outra banda da nossa história. Esse olhar de que somos todos seres humanos, é muito bonito, romântico e poético, mas é justamente essa leitura que reforça e justifica o abandono de gerações e gerações de afrodescendentes. De fato somos "iguais" do ponto de vista biológico, mas numa sociedade ainda organizada com valores e padrões eurocêntricos, “uns são mais iguais do que “outros”. O preconceito étnico está nas entranhas, por mais que ele não transpareça, as frestas das consciências ainda estão impregnadas e vez ou outra ele vem à superfície. A recente divisão da sociedade brasileira com a políticas de cotas tem mostrado isso, vem com aquele discurso pseudo paternalista de que os cotistas não terão condições de acompanhar o curso... evidenciando de um lado a crença na inferioridade e a preocupação da saída desses jovens de um lugar que até então era tido como NATURAL. O fato de discutirmos publicamente tais questões não nos faz "racistas", precisamos ter coragem de dizer, colocar o dedo na ferida, fazendo jus a categoria de sujeitos pensantes. As ciências humanas e da natureza surgiram dentro dessa lógica, alguns saberes ao longo dos séculos 19 e 20 romperam com esse formato de educação eurocêntrica, outros continuam reproduzindo e sustentando “dogmas” de neutralidade política, deixando a “ciência” acima de qualquer suspeita. Procuro respeitar o direito daqueles que pensam diferente... mas se tem uma coisa da qual não abro mão é do meu direito de pensar diferente e de dizer o que penso. Qualquer um que tenha essa postura é bem-vindo nesse diálogo.