domingo, 10 de dezembro de 2017

Kmila CDD - PRETA CABULOSA Full Album




Outra face da prostituição: Idosas, Negras e Analfabetas

A reportagem é um relato sobre a vida de mulheres na prostituição aos 40, 50, 60 e até 70 anos. Segundo as organizadoras do Grupo Mulheres da Luz, duas ex prostitutas e uma irmã da Igreja, elas fazem o possível e o impossível para dignificar a vida dessas mulheres.

“As mulheres que cumprimetei no caminho na verdade estão todas se prostituindo”. Assim Cleone começa nossa conversa enquanto caminhamos para a sede do Parque da Luz, ao lado da Pinacoteca do Estado em São Paulo, uma construção antiga, tombada, e que hoje abriga o Grupo Mulheres da Luz formado por duas ex-prostitutas L.T. (mantivemos o nome em sigilo a pedido da entrevistada), Cleone e Regina, uma irmã da Igreja que há anos auxilia mulheres prostitutas.
O grupo que foi se organizando nesse espaço, conquistado mediante muita luta, possibilita que mulheres que se prostituem durante a semana no parque tenham acesso a aulas, já que muitas querem sanar a dificuldade de ler e escrever. A organização também serve como apoio diverso e acolhimento, pois na maioria das vezes elas se sentem solitárias e culpadas. Essa organização se dá mesmo na ausência de apoio público e do próprio movimento feminista.


É no caminho até a sede do parque que fui vendo uma face da prostituição muito distante daquela pintada pela mídia com a imagem da Bruna Surfustinha e até mesmo da Bebel da novela Paraíso Tropical. Glamour que não existe para as mulheres que estão no Parque da Luz. O que vi foram várias mulheres que são auxiliadas pelo Grupo Mulheres da Luz, sentadas em bancos da praça, cada qual no seu canto, algumas com maquiagem colorida, roupas do dia a dia, algumas conversando entre si, outras nitidamente apreensivas, e todas com a idade que eu remetia a minha avó e mãe.
Para quem passa desapercebido são só mulheres sentadas numa praça. Para quem começa a observar atentamente são muitas. Segundo os dados recolhidos pela irmã, ali ficam mulheres de 21 a 70 anos, mas a grande maioria da área tem entre 40 e 50 anos. O que choca é uma mulher no auge dos seus 70 anos ali se prostituindo e sustentando netos e filhos. Sim, a grande maioria tem filhos, netos e faz o que faz pelas suas famílias.
Segundo a fundação francesa Scelles, mais de 40 milhões de pessoas se prostituem no mundo. Dessas, 75% são mulheres entre 13 e 25 anos. Sendo assim, as mulheres que na Luz se prostituem fogem das estatísticas mundiais, fato que ajuda a entender toda a realidade de maior vulnerabilidade a que elas estão expostas.
É no porão, a partir de algumas cadeiras que foram doadas, que a sala de aula vai ganhando forma em um dos três cômodos daquele espaço. Sento e fico de frente com L.T., Cleone e Regina. As três que vão me expondo com desenvoltura a necessidade da criação de novas possibilidades para as mulheres prostitutas do Parque da Luz.

Livros recolhidos para a biblioteca que pretendem formar em um dos cômodos
Segundo Cleone, depois dos 28 anos, uma prostituta não tem mais “valor” nesse meio. Por isso muitas estão ali, já que naquele espaço elas têm a possibilidade de se livrar dos temidos cafetões. Mesmo com a segurança do parque, a não presença de um cafetão e a idade mais avançada significam receber valores baixíssimos pelos programas: entre 20 e 30 reais. O valor é abaixo do preço dos próprios hotéis da área, geralmente usados para os programas. Esses costumam cobrar entre 30 e 50 reais.
A higiene dos espaços é nula. Os lençóis não são trocados entre um programa e outro, os espaços são precários e nem as toalhas de banho são lavadas, relata L.T. Segundo ela e Cleone, o cliente geralmente se responsabiliza por pagar o hotel. Algumas delas, porém, também usam esses espaços como dormitório, quando não possuem onde ficar, o que acaba sendo recorrente.
“A violência começa quando a gente esconde da família”.
É assim que L.T sintetiza as suas vivências como prostituta. Segundo ela, a primeira violência é essa. Depois, achar que a escolha é uma opção, quando para elas, as mulheres na verdade são reféns de um sistema que por fim as tornam em pedaços de carne, vistas como “boas de cama” e que quando são negras, um pedaço de carne que ganha menos.
Logo depois dessa opinião, que diverge de algumas prostitutas ativistas, pergunto o posicionamento das três, que se organizam durante todo final de ano para doar presentes e fazer almoços para os filhos dessas mulheres que se prostituem, sobre a regulamentação da prostituição e a resposta é unânime:
“Somos contra. Não podemos ser a favor da regulamentação de algo que não se faz por escolha. A dignidade delas é tirada, a maioria dessas mulheres não sabem quais são seus direitos”.
A irmã Regina ainda enfatiza que muitas delas não querem nem ouvir falar sobre isso, pois acham que a regulamentação inclusive não trará benefícios para elas. A maioria das mulheres que se prostituem naquela área moram nas periferias e bordas da cidade de São Paulo, enfrentam grandes distâncias de mais de três horas para chegar ao Centro da metrópole, onde se prostituem muitas vezes sem a família saber. Fazem isso para ajudar os filhos e netos que estão em situação difícil. Algumas mentem que vão trabalhar como doméstica, quando na verdade vão para a praça se prostituir. Essas mulheres, devido a essa condição, de acordo com Cleone, não querem ter uma carteira assinada pois o anonimato as protege. Perguntei para Cleone se para ela, mulher negra que já vivenciou a prostituição e agora auxilia o grupo de apoio às diversas mulheres na mesma situação, se ela via alguma forma de empoderamento na prostituição:
“Só haverá empoderamento se as mulheres conseguirem estudar, ter acesso a políticas públicas, mas também buscar uma forma de ter uma outra alternativa”.

Cartaz na parede da sede
É do próprio feminismo pautar que na sociedade atual as mulheres ainda não são vistas como sujeitas. É claro que mulheres negras já recorrem aos recortes para evidenciar que quando se une classe, raça e gênero, como fatores que te colocam numa situação de desprivilégio, a possibilidade de se fazer escolhas é praticamente nula para mulheres negras, pobres e analfabetas, como é o caso de algumas mulheres que se prostituem na Luz. Cleone e as parceiras de ativismo recolhem doações de sabonetes, pastas de dentes e alimentos que têm como destino as mulheres e seus familiares, já que isso suaviza o orçamento delas no fim do mês. Uma que tem o filho numa penitenciária é uma das mais necessitadas nesse quesito, segundo a irmã Regina:
“Estamos falando de necessidades básicas. Elas precisam do básico”.
Regina tem num caderno dados sobre essas mulheres. É assim que vão tendo um controle sobre a área e o que precisam conseguir urgentemente para algumas delas. É terrível perceber que elas não possuem muito apoio, mesmo de grupos que lutam pela emancipação feminina. Pergunto do porquê dessa falta de apoio de feministas em amparar as mulheres que estão na prostituição, passando necessidades financeiras e até fome. Cleone é enfática:
“As feministas não têm claro qual é a verdadeira situação das mulheres, principalmente as idosas que estão dentro da prostituição”.
Cleone diz que nós mulheres, prostitutas ou não, deveríamos nos unir para apoiar umas às outras, principalmente as que precisam de acesso às políticas públicas e de recursos que muitas vezes nos soam banais, como uma pasta de dente, mas que para elas são um alívio no orçamento. Como os valores do programa são baixos, muitas não conseguem nem o dinheiro para garantir as refeições e/ou a condução de volta.
Por isso o sonho de Cleone e da irmã Regina é uma casa para acolher essas mulheres. O porão seria uma sede provisória, para o sonho que elas admitem ser alto. Atualmente é só o Parque fechar, de acordo com os seus horários comerciais, que algumas saem para se prostituir ali nos arredores da Luz, de forma totalmente desprotegida. Outras simplesmente viram a noite porque não têm onde dormir ou o dinheiro para voltar para suas casas. Uma passagem hoje custa 3,80 e mesmo cobrando valores baixos pelo programa, nem sempre elas garantem a possibilidade de voltar para a casa.
É naquele espaço público que as protege, onde muitas vezes elas queriam ter o dinheiro da passagem e do dia garantido para sair dali, que essas mulheres tem que escutar coisas como:
“Eu prefiro meu marido aqui com vocês do que estuprando uma filha minha”.
As agressões psicológicas vão tomando o ar dos comentários e são feitas descaradamente. Essa é verdadeira face do Brasil, um mix de ódio de gênero, classe e raça que recai sobre mulheres negras e/ou pobres que são invisíveis aos olhos de muitos que usam o parque para cortar caminho, vão na Pinacoteca para prestigiar obras de arte e fazem da Estação da Luz seu principal ponto de partida e chegada.

Cesto de camisinhas e livros
Os homens que procuram essas mulheres e as usam para exacerbar seu ideal de masculinidade são em sua maioria muito, muito pobres e muitos mais velhos do que os de filmes como Uma Linda Mulher, que te fizeram romantizar a prostituição. Homens que pagam mais caro para elas não exigirem preservativos e algumas inclusive aceitam pois precisam dos reais a mais. Cinco, dez, quinze reais fazem muita diferença para essas mulheres, que por isso aceitam e se tornam suscetíveis a sífilis, gonorreia, entre outras DSTs. Lembrando que a A Lei Maria da Penha entende isso como violência sexual.
A violência sexual é definida pela Lei Maria da Penha no inciso III do Artigo 7o como “qualquer conduta que constranja [a mulher] a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos” (Brasil, 2006).
Em linhas gerais as pessoas vão dizer que não existe impedimento, mas uma mulher vulnerável não tem opções diante da possibilidade de obter mais recursos financeiros cedendo e não usando preservativos. A vulnerabilidade nas palavras de L.T é extrema. Além de física, também é psicológica. Segundo a irmã, algumas delas têm doenças mentais e mesmo assim continuam se prostituindo. Para Cleone, esse é um estrago causado pelo sofrimento, que está envolvido em questões da realidade marginalizada dessas mulheres e da situação que vivem enquanto prostitutas:
“Precisamos melhorar nosso espaço, e ter um psicólogo promovendo atendimento aqui todo dia sem julgar elas. Isso é urgente”.
Realmente o porão tem ainda um ar de provisório. Elas ainda esperam os documentos para ficarem realmente com o local e tornar ali uma área de acolhimento. O problema é que ainda faltam recursos, ajuda e apoio de fora.
Cleone diz que até é convidada para alguns debates sobre prostituição, mas se nega a ir pois a realidade dela ali com essas mulheres é outra. Para as três, mesmo com todo apoio e histórico de envolvimento com a luta de prostitutas, essas mulheres não querem debater a regulamentação, pois entendem que é diferente estar aos 60 anos nesta situação para comprar pasta de dente pro filho na prisão.
“Elas são independentes, inclusive muitas buscam na prostituição a fuga de famílias patriarcais. Acabam na prostituição e acham que terão vidas melhores. Meninas sensíveis, inteligentes e sonhadoras”.

Cartilha do GMEL grupo que Cleone colaborou com informações sobre leis e telefones e endereços úteis
A irmã Regina enfatiza em vários momentos o quão inteligente e cheias de capacidades distintas essas mulheres têm caso lhes dessem chances. Por isso, para a irmã, o silenciamento que essas mulheres sofrem é mais uma das violências sofridas por mulheres que deveriam estar falando por si e tendo espaço para isso. São mulheres de uma potencialidade humana e intelectual enormes que não falam e tem medo de falar, completa a irmã.
No grupo tem mulheres que são artistas, escritoras, desenhistas e pintoras. Eufóricas e com muita alegria contam que uma delas escreve poesia. Eu pergunto se é algo como Carolina Maria de Jesus e Cleone me diz que é essa a semelhança, uma mulher escrevendo o dia a dia dela em papéis e nem sendo totalmente alfabetizada.
Não tem como não ficar triste com a realidade que elas vão me relatando. É de apertar o peito. O Parque querendo ou não protege essas mulheres que com a idade mais avançada são motivos de chacota e repúdio. Algumas delas têm medo de qualquer coisa e preferem não aparecer em fotos, entrevistas e eventos que pretendem debater a realidade da prostituição no Brasil. Foram ensinadas e condicionadas a serem discretas e silenciosas. É isso que uma mera passada no Parque evidência. É com o tempo e a auto organização, que elas estão aprendendo a se auto proteger. As três sempre repetem nas conversas com todas:
“Vocês tem voz, vocês precisam ser unidas”.
Mesmo que as três afirmem isso, ainda é complexo demais. Segundo elas, muitas brigas acontecem e por incrível que pareça o mais difícil é lidar com os sentimentos distintos e a necessidade de atenção de tantas mulheres. A sensação mais presente é a da culpa, de acordo com a irmã Regina:
“Algumas aqui sentem muita culpa, muita culpa mesmo. Sabem que os homens que pagam têm famílias e elas dizem que o dinheiro dado para elas é amaldiçoado e por isso não conseguem sair da vida, pois é o dinheiro do pão dos filhos que eles dão para elas.”
“Hoje eu ainda não pequei.” - É isso que Cleone diz que escuta de uma das mulheres. E ainda completa: "Tem dia que chego em casa e não consigo dormir”.
Cleone é uma mulher negra que viveu a realidade distinta para negras na prostituição e que agora tenta com seus esforços ajudar as mulheres que ainda estão nessa realidade, mas sem apoio nenhum. O mito da mulher negra ser forte se materializa na sua imagem, de alguém que também precisa de apoio para si, mas continua ali lutando coletivamente por várias mulheres. A sensação é de impotência ao perceber que mulheres que poderiam ser nossas mães, avós estão ali.

Cronograma dos eventos criados pelo grupo com as mulheres
Pelo que elas me contaram, até uma mulher de 80 anos já se prostituiu ali nas áreas centrais e por incrível que pareça chamava atenção de jovens que viam nela a possibilidade de uma experiência sexual diferente. Outra mulher negra que mesmo aos 80 anos era de alguma forma o objeto de diversão das pessoas. Cleone me diz que uma já cega continuou se prostituindo na Sé, e eu não consigo cogitar o que leva homens a se envolver com idosa cega e pagando ela para isso. Outra aos 74 anos se aposentou mas entrou em depressão, já que desde os 19 fazia isso e não sabia que poderia fazer outra coisa da vida já que sempre foi prostituta. Por isso, mesmo nessa idade preferia retomar o ofício. Poderia ser minha ou sua avó. Estamos falando de um cenário de extrema pobreza que filmes nacionais insistem em apenas retratar nas regiões norte e nordeste, mas que tive contato no centro de São Paulo.
“Não queremos vitimizar essas mulheres, mas queremos mostrar que elas existem”.
É a frase que escuto da irmã, como se ela pedisse desculpas por contar que as mulheres são semi analfabetas e algumas completamente analfabetas e têm a sua vida ali 24 horas do dia diante do cenário de pobreza e miséria no meio do centro de uma das cidades mais ricas do país.
Na gestão passada do ex prefeito Haddad na na cidade de São Paulo, elas tiveram reuniões e momentos de discussão via secretaria de política para mulheres. Atualmente elas não sabem como será diante da gestão do PSDB do atual prefeito Dória em que já se nota políticas higienistas que não beneficiam essas mulheres e nem qualquer outra população vulnerável.
Talvez o pouco conquistado, como ter uma relação com uma secretária da prefeitura, se perca na atual gestão. É fato que tudo está em jogo e quem tem que pedir desculpas para essas mulheres é a sociedade, que não possibilita nem o mínimo que as três pedem: um espaço para dar comida, ensinar a ler e possibilitar a elas que durmam no centro quando necessário.
FONTE:http://www.almapreta.com/editorias/realidade/outra-face-da-prostituicao-idosas-negras-e-analfabetas

“A sensação de liberdade é melhor do que a de ganhar um campeonato”, conta Victor Ambergue após dois meses preso

Victor Ambergue, jovem de 23 anos, funcionário da empresa Desmarinas Transportes e jogador de futebol da várzea de São Paulo, foi preso em 6 de Outubro, acusado de roubo e sequestro. Todas as provas apontavam para a sua inocência, que foi confirmada na audiência de quinta-feira, 7 de dezembro

Victor Ambergue, 23 anos, não voltou para casa desde o dia 6 de outubro, quando policiais militares foram até a sua residência, na Vila Sabrina, zona norte, e o levaram preso sob acusação de sequestro e roubo. Mesmo com evidências e testemunhas que asseguravam a não presença do jovem no local do crime, Victor ficou por dois meses e um dia no Centro de Detenção Provisória (CDP), em Pinheiros. Na audiência de instrução de ontem, 7 de dezembro, foi concedida a liberdade provisória.
“A sensação de liberdade é melhor do que a de ganhar um campeonato. A liberdade nada nesse mundo pode comprar. Agora é me cuidar e seguir fazendo o que eu sempre fiz, trabalhar, jogar bola, e cuidar da família”, conta Victor Ambergue, funcionário da empresa Desmarinas Transportes e jogador conhecido nos campos de várzea de São Paulo.
Dezenas de pessoas foram até o Fórum Criminal da Barra Funda para acompanhar o caso ou depor. A sessão estava marcada para às 14h, mas não começou antes de 15h30. Alessandra Aparecida Rocha Gabriel, mãe do jovem, chegou ao Fórum às 13h30, assim como outros familiares. Lá permaneceram até a decisão final da juíza Cristina Escher, por volta das 17h30, que decidiu pela soltura depois de uma série de testemunhos.

“Foi muito bom receber meu filho de volta. Foram dois meses sem dormir, nem eu, nem minha família. A gente conseguiu ter uma noite tranquila, fazer uma refeição tranquila, porque a vida da nossa família virou de perna para o ar. Estava todo mundo focado nele. A liberdade do Victor foi a melhor sensação do mundo”, conta Alessandra Aparecida, mãe de Victor.

Ana Paula Félix e Alessandra Pereira, mãe de Victor, acompanharam a audiência de Victor (Foto: Semayat Oliveira/Nós, Mulheres da Periferia)
O caso
Victor Ambergue foi acusado de participar de um assalto que aconteceu na noite de 26 de Julho, na zona leste, quando um motorista do aplicativo 99 foi chamado para uma corrida na Penha e os três supostos clientes anunciaram um assalto: levaram o celular, jaqueta, tênis, cartões e documentos da vítima.
Duas provas foram levantadas pela Polícia Militar e Civil.
A primeira foi o celular, apreendido com Victor. O jovem negou saber da procedência do aparelho, que tinha comprado via internet, pela página no Facebook de vendas online “Desapego”. O dispositivo móvel era o mesmo do assalto de 26 de Julho.
A segunda foi o reconhecimento de Victor por parte do motorista, 71 dias após o crime, que havia descrito os assaltantes como dois homens brancos e um pardo. Victor é preto.

Entre as testemunhas que foram depor, estava o gerente e a dona da empresa em que o jovem trabalhava no período. Ambos confirmaram que, no dia e horário do crime, ele cumpria expediente na zona norte, a 20km do local do fato. Além disso, um documento assinado por mais de 12 colegas de trabalho e a folha de ponto também foram elementos utilizados na defesa.

O empresário do setor imobiliário, Roberto Soares Rossi, também estava lá. Ele já havia deposto em 9 de outubro na 3ª Delegacia de Divisão Antissequestro do DHPP. O celular foi colocado a venda por ele, via Facebook. Depois de recebê-lo de um antigo inquilino como forma de pagamento por um aluguel atrasado, antes deste voltar para a sua cidade natal, no estado da Bahia. Rossi consultou e não identificou nenhum tipo de bloqueio do aparelho na Anatel, então, anunciou. Victor o comprou por R$ 800,00.
Familiares, amigos e ativistas da União dos Coletivos Pan-Africanistas (UCPA) acompanharam a audiência de Victor (Foto: Semayat Oliveira/Nós, Mulheres da Periferia)
A espera
Alessandra, que imaginou ser mentira quando soube da prisão, lembra que sempre se preocupou em ensinar aos filhos a necessidade do respeito ao próximo, independente de sua classe, cor ou orientação sexual.
Durante todos esses dias, ela recebia mensagens de pessoas próximas do filho que diziam: “não, o Victor não!”.
Jogador de futebol de várzea, o filho já foi vítima de episódios em que torcedores fizeram xingamentos racistas contra ele ou amigos em campo. “Ele ficava muito irritado com isso, mas nunca tomamos nenhuma providência”, contou Alessandra.
Em sua opinião, o fato de serem negros torna as coisas mais difíceis: “No momento do boletim de ocorrência a vítima fala que eram dois brancos e um pardo. E na hora de reconhecer, reconhece um homem preto?”.
No Fórum a tensão era óbvia, foram horas de espera e ela se sentou apenas uma vez, por poucos minutos. Sua amiga, Ana Paula Félix, funcionária pública e moradora da zona leste, tem acompanhado o caso desde o início e também estava lá. Foi ela que provocou alguns sorrisos durante a espera.
“Lembra quando o Victor era pequeno e íamos te visitar? Nossa, ele corria pela rua com o seu irmão pra empinar pipa, lembra?”, Alessandra perguntou, sorrindo. Ana assentiu e já emendava em outra história engraçada que as duas viveram. Tudo durava até o próximo choro.
No fim da tarde, o advogado foi ao encontro da família e fez um sinal de “joia”. Stephanie Rodrigues, companheira de Victor, com quem teve um menino, Arthur, disse emocionada que ele não tinha feito nada para estar ali. “Foram dias de tristeza e angústia”. Ela não via a horas para que eles se reencontrassem, dessa vez em casa, fora da prisão.
Alessandra, além de chorar e agradecer a todos que estavam presentes, começou a planejar como eles poderiam celebrar, juntos. Talvez um churrasco. “Eu não vejo a hora de buscar meu menino amanhã cedo”, que seria a manhã desta sexta-feira. Mas ele foi liberado na noite de quinta-feira mesmo.
Ana Paula, que conheceu Victor ainda criança, disse que o que aconteceu com ele a fez lembrar de seu filhos, que tem 16 anos. “Se aconteceu com ele, um menino negro, trabalhador e que mora na periferia, poderia acontecer com o meu filho também”.
FONTE:http://www.almapreta.com/editorias/da-ponte-pra-ca/a-sensacao-de-liberdade-e-melhor-do-que-a-de-ganhar-um-campeonato-conta-victor-ambergue-apos-dois-meses-preso