terça-feira, 22 de novembro de 2016

AS MINA QUE RIMA: REPRESENTATIVIDADE FEMININA NO RAP NACIONAL

A busca feminina por espaço igualitário dentro do gênero musical proveniente do movimento Hip Hop.

Oito mulheres em uma batalha com um só objetivo: eleger a melhor MC (mestre de cerimônias)através de rimas feitas com temas escolhidos pela plateia.
Este é o formato da Batalha da Dominação, uma competição de rimas na qual somente mulheres podem participar. O evento que teve a sua última edição realizada no V Fórum Nacional das Mulheres no Hip Hop, nos dias 16 e 17 de setembro, em São Paulo, surgiu através da necessidade de criar mais espaços de protagonismo para as mulheres que já participam ou se interessam em participar da cultura Hip Hop através do elemento do RAP. “Hoje as minas estão travando uma luta muito forte, que é uma luta de se empoderar, empoderar outras minas e bater de frente, falar eu posso, eu estou aqui e eu vou fazer”, explica Sara Donato, organizadora da Batalha da Dominação.
As batalhas de rima são comuns, principalmente as do formato conhecido pelos participantes como “sangrento”, no qual um MC rima contra o outro sobre temas livres, geralmente pautados em apontar os defeitos e ridicularizar o adversário.

Esse formato também é misto, ou seja, recebe participantes tanto do gênero feminino quanto do gênero masculino. Porém, as MCs e a organização do evento notaram que este modelo de batalha muitas vezes reprime a participação não apenas das mulheres, que muitas vezes recebem ofensas dos seus adversários relacionadas ao gênero, como também dos próprios homens que estão iniciando a sua trajetória dentro do RAP, como observa a Karine Machado, vencedora desta última edição da Batalha da Dominação“Eu sempre tive um ótimo desempenho nas batalhas de sangue, não me deixava abater e levava na esportiva, sabia me defender, mas fui notando que aquele tipo de batalha não tinha nada à somar, muito pelo contrário, presenciei até mesmo homens que batalharam comigo e se sentiram tão intimidados que falaram que não queriam batalhar nunca mais. Para mim não é interessante causar isso à ninguém, muito menos para as minhas irmãs”, reflete a MC.
Pensando em aumentar e estimular a participação de mulheres em batalhas, o evento opta
pelo formato conhecido como “batalha do conhecimento”, no qual temas como a legalização do aborto, a transfobia, entre outros, são sugeridos pela plateia e desafiam as competidoras a mostrar através das rimas o que pensam sobre cada um dos assuntos, e ao final de cada batalha de rima, a plateia escolhe qual MC passa para a próxima fase da competição.

As minas têm muita ideia pra dar: Mesmo grávida de gêmeos e em uma gravidez de risco, a Karine, embarcou em um voo de Florianópolis até São Paulo para participar da batalha e do fórum. O resultado? A conquista do primeiro lugar da batalha. A MC ressalta que a maternidade não precisa ser um obstáculo e que o importante é estar presente e dar voz aos ideais pelos quais ela luta, “a minha gestação passa uma mensagem forte tanto para as mulheres quanto para os homens pois, geralmente, o homem pensa que quando uma mulher se torna mãe, pronto, acabou para ela! Principalmente no RAP…Acabou, vai para casa cuidar do filho e já era. Mas a maternidade não veio para brecar nenhuma mulher, ela veio para somar, pois é uma oportunidade de evolução, e eu como gestante batalhando provo que uma mulher pode ser feminina, pode ser mãe, pode estar grávida e ainda assim ela tem espaço de representatividade, nós não precisamos mais abrir mão da nossa feminilidade para nos igualarmos aos homens em busca de espaço de fala”, conta Karine.

A MC enfrentou a possibilidade de não conseguir vir até São Paulo para participar do evento quando percebeu que não teria condições financeiras de arcar com os custos da viagem, mas, recebeu forte apoio das mulheres militantes do movimento e outras MC’s do sul do país que se uniram para juntar o dinheiro através de doações e ações culturais, conseguindo assim, financiar a grande parte dos gastos, “eu era a única representante do Sul na Liga de Mc’s, então graças às irmãs nós conseguimos fazer uma vaquinha online e hoje eu estou aqui, presente, podendo levar a minha ideia à todas e trocar com as minas de outras regiões que conseguiram colar”, relata.
A união faz a força: Outro exemplo de que a união feminina está movendo barreiras é o próprio V Fórum Nacional das Mulheres no Hip Hop, encontro que acontece há 5 anos e que reúne mulheres de todos os elementos do movimento, vindas de todas as regiões do país para criar cultura, aprender e debater principalmente temáticas acerca das questões de gênero dentro do Hip-Hop.
A organizadora e militante, Nerie Bento, afirma que o movimento Hip-Hop é predominantemente machista. “Hoje nós temos um problema muito grande que é fazer os homens nos enxergarem enquanto profissionais, e melhor ainda, profissionais de qualidade. Por isso, nós temos poucos apoiadores do gênero masculino, e ainda assim os que apoiam, é de forma indireta e com uma participação tímida”, observa a militante.
Os reflexos desse machismo também são observados pela organizadora da Batalha da Dominação, que relata que, embora os homens sejam convidados a assistirem as batalhas e a participarem dando apoio e prestigiando as mulheres, a presença do gênero masculino é pequena nos eventos aonde o protagonismo feminino é o foco, “o machismo dentro do Hip Hop é uma extensão do que acontece na sociedade em geral, então o problema é que os homens reproduzem dentro do movimento as atitudes machistas que eles foram ensinados a ter desde pequenos, e só alguns manos colam nos nossos eventos, e só os que têm a caminhada certa, por que se tiver a caminhada errada, se não respeitar as minas, a gente não faz questão da presença mesmo”, conta Sara Donato.
As organizadoras de ambos os eventos reforçam que, embora o foco seja a discussão do protagonismo feminino dentro do Hip Hop e do Rap, a participação masculina é bem-vinda.
A próxima edição do fórum acontece somente em 2017, mas a Batalha da Dominaçãopossui edições previstas ainda para esse ano que serão divulgadas previamente nas redes sociais do evento.
FONTE:http://www.zonasuburbana.com.br/as-mina-que-rima-representatividade-feminina-no-rap-nacional/

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