sábado, 17 de agosto de 2013

MV Bill: "As pessoas podem acordar agora, mas a cultura hip hop nunca dormiu"

Rapper conversa com o iG sobre o novo disco, "Monstrão", e fala sobre os livros que pretende lançar

"Monstrão é uma expressão bastante usada
pela galera do hip hop atualmente. É uma palavra bacana porque tem grandiosidade ao mesmo tempo em que é enraizada", define o rapper MV Bill, em entrevista ao 
iG , sobre o nome de seu mais novo trabalho. Aos 39 anos, o carioca Alex Pereira Barbosa, o MV Bill, está no hip hop desde 1993 - além disso, desenvolveu também trabalho como ativista em favelas brasileiras e como escritor em obras que retratam a periferia.

"Sou um cara que atravessou uma geracão, e estou cantando para uma nova. Quando esses jovens me chamam de monstrão, entendo como uma forma carinhosa de reconhecimento do meu trabalho", completa. "Monstrão" tem a participação da irmã de Bill, Kmila CDD. As letras CDD do nome da rapper fazem referência à Cidade de Deus, no Rio, onde os irmãos cresceram.

Mulheres "mandam o recado"
"Passei um bom período convivendo com quatro mulheres (a mãe e as irmãs). Eram quatro choros por namorado, quatro TPMs. Acabou que fiquei mais sensível a essas questões que não caberiam na minha voz, mas a Kmila manda o recado", explica sobre a participação da irmã nos vocais do disco novo.
"Alguns pensamentos ficam mais bonitos quando vêm na voz feminina. Ela dá um recado importante que muitas mulheres querem dizer, mas não têm a chance, não dizem por causa da violência ou não têm coragem. A Kmila é esse personagem que entra no disco."
"A cultura hip hop nunca dormiu"
Quando questionado se os protestos pelo País influenciaram na composição das faixas do novo disco, MV Bill, com a percepção de um ativista social, é direto: "Muitas pessoas podem estar acordando agora, mas quem é envolvido com a cultura hip hop nunca dormiu". "Se (no disco) tiver menção que se conecte (com os protestos) é pura coincidência, porque já tenho essa militância há anos. Algumas músicas já proclamavam o repúdio à corrupção."

Ativismo Social
MV Bill é um dos fundadores da Cufa (Central Única das Favelas), organização não-governamental que conecta jovens carentes com a cultura do hip hop. Sobre as atuais ações do governo para pacificar as favelas, o rapper diz que "investir apenas no braço armado não traz transformação ao lugar". Para MV Bill, faltam "outros exércitos além da polícia, como médicos e profissionais que devolvam a autoestima da comunidade". 
Rap nacional
Com os ouvidos abertos para a cena de hip hop brasileira, MV Bill toca nos dois programas de rádios que apresenta vários nomes do País. "(Nos programas) só toco rap brasileiro e aproveito minhas viagens pelo Brasil para receber material. Estou curtindo o MC Ramonzinho, o MC Amiri e o MC RAPadura, do Nordeste, que mistura muito bem o rap com o repente."
Pop x underground
"É difícil falar de (um rap que seja) pop no Brasil porque as músicas não entram na programação das rádios, as emissoras de clipe têm restrição. (O rap) é um espaço ainda muito restrito. Como é muito alternativo, qualquer um que se destaca acaba destoando do resto do movimento. Mas esse destaque não é suficiente para chamar de pop. Isso fica para o sertanejo, pagode e uns funks, no sentido literal da palavra", analisa MV Bill.
Segundo o rapper, a cena de hip hop brasileira "ainda não é popular". Em compensação, isso "cria uma estrada mais consolidada, porque é com base na verdade. Não existe a cultura do jabá, com isso tem mais durabilidade. Jovens que não viveram o momento de músicas como 'Soldado do Morro', de 1999, pedem hoje para eu tocar. Se tivesse estourado antes, não sei se teria a mesma força agora."
Literatura das ruas
MV Bill prepara o lançamento de dois livros. Em "Na Boca do Sapo", ele e Celso Athayde (com quem fez livros e o documentário "Falcão - Meninos do Tráfico") escrevem sobre a vida na Favela do Sapo, na visão de Celso, e o dia a dia na Cidade de Deus, segundo Bill.
O outro título, "CDD Anos 80", tem um aspecto mais pessoal do rapper com a comunidade de Cidade de Deus. "Não chega a ser uma autobiografia. Vou falar do período dos anos 1980 da minha vida até uma parte mais recente como o meu amadurecimento e as transformações da CDD."

Michelle Obama vai lançar álbum com estrelas do hip-hop.

Run-DMC, Doug E Fresh, Jordin Sparks e Ashanti estão no disco.Projeto deve arrecadar fundos para campanha contra obesidade infantil.


A primeira-dama dos Estados Unidos,Michelle Obama, lançará um álbum com estrelas do hip-hop para promover sua campanha contra a obesidade infantil, segundo informações da agência Ansa.
Com 19 faixas, o disco "Songs for a healthier America" deve ser divulgado em setembro, com participações de artistas como Jordin Sparks, Ashanti, Run DMC, Doug E. Fresh e Monifah, de acordo com o site Politico. "We like vegetables", "U R What You Eat" e "Veggie Luv" são algumas das canções.
Não está previsto, no entanto, que Michelle cante, mas ela aparecerá em dez videoclipes que devem ser distribuídos entre escolas norte-americanas. De acordo com dados da organização liderada por Michelle, a Let's Move, o número de criança obesas nos Estados Unidos triplicou nos últimos três anos.


Anitta, embranquecimento e elitização

Seja pelo preconceito de classe ou pela intolerância diante de letras com conteúdo sexual explícito, as mulheres do funk são grandes vítimas da misoginia e do racismo. Esse grande repúdio contra as artistas femininas do funk é intimamente relacionado à repulsa às mulheres negras, não somente porque a maioria das funkeiras são negras, mas porque o funk tem raizes históricas e é intimamente ligado à cultura negra brasileira.

No entanto, há pelo menos um exemplo atual de mulher que veio do funk e é amplamente aceita e celebrada na mídia: a Anitta. Enquanto as outras artistas têm suas raízes no funk tradicional com letras explícitas, a Anitta é apresentada como uma funkeira voltada para a cultura pop, com uma produção higienizada e pronta para o consumo. Artistas como a Anitta são reposicionadas em uma nova classe social, que embranquece suas expressões artísticas e as torna muito mais “adequadas” para a televisão brasileira.

Há divergências sobre os motivos que levam a Anitta a ter mais sucesso que outras artistas similares. Alguns ativistas acreditam ser devido a uma suposta branquitude. No entanto, enxergar Anitta como uma pessoa branca demonstra a naturalização do processo de embranquecimento racial. Em uma sociedade que tem como branca qualquer pessoa miscigenada de pele clara, o caso de Anitta merece no mínimo uma reflexão.

É preciso entender que a identidade que Anitta ou outras artistas possuem sobre suas cores é algo subjetivo, construído ao longo dos anos sob influência da sociedade. Não adianta relativizar o reconhecimento racial e reduzi-lo a uma questão de afirmação, pois compreender-se como negra não é um fator decisivo para que alguém seja tratada como negra; para isso acontecer, é necessário que a sociedade também consiga ver a negritude nessa pessoa.

A Anitta é um exemplo de uma mulher miscigenada que foi embraquecida e “enriquecida” para que o seu trabalho artístico fosse valorizado. A aparência de Anitta vem se tornando cada vez mais diferente desde a sua fama, com tratamentos de clareamento sobre uma imagem cada vez mais elitizada. Sabendo disso, vale a reflexão: será que Anitta é aceita por ser reconhecida como uma mulher branca ou terá embranquecido em busca de aceitação? Se outras funkeiras passassem por um processo de embraquecimento e elitização classial, seriam elas abraçadas pelos programas da televisão aberta nos mais diversos horários?

Esse processo não diz respeito somente ao embranquecimento de características físicas, como cabelos lisos, pele clara e nariz fino, mas está também relacionado à repressão da sexualidade feminina. O funk bem aceito socialmente é aquele que constrói uma sensualidade feminina tolerável, que não intimida o machismo. E a sexualidade feminina que é aceita é aquela que não causa choques. A Valesca Popozuda é um bom exemplo: embora em sua aparência atual ela seja vista como uma mulher “morena clara”, ou em alguns casos até mesmo branca, o modo como lida com o sexo sem eufemismos faz com que sua expressão artística seja repudiada socialmente.

Artistas femininas sofrem uma imposição de limite sobre a sensualidade, que só pode ser expressada de modo comedido e elitizado: uma mulher que rebola na MTV é muito mais aceita artisticamente do que aquela que rebola em um baile funk no morro. É extremamente importante notar, no entanto, que nenhuma mulher é plenamente aceita ao expressar sua sexualidade. Ao final do dia, todas essas mulheres têm algo em comum: todas elas são transformadas em objetos de consumo.

Ser consumida, nesse caso, significa oferecer a sensação de controle ao público masculino. A mulher objeto de consumo deve expressar sensualidade, mas não ao ponto de fazer com o que o homem se sinta ameaçado, nem na eminência de ser “traído”. Caso a mulher expresse sua sexualidade de forma objetiva e direta, ela é tida como uma “vadia” indigna de valor e seriedade. A mulher negra, especificamente, carrega nos ombros o estereótipo de “mulher consumível” e descartável, para ser “usada” e jogada fora, ao contrário do produto mais cotado e duradouro: a mulher branca. Essa é a realidade da misoginia: as mulheres são tratadas como mercadorias, algumas mais valorizadas do que outras.

Embora a questão da branquitude de Anitta seja debatível perante nossos olhos, o problema é muito mais profundo e está entranhado em diversas nuances da sociedade. A questão não é atribuir uma identidade a Anitta ou outras artistas brasileiras, mas sim levantar o questionamento sobre a possibilidade de sucesso e a aceitação social dependerem de uma branquitude, seja ela real ou imposta. Uma pele clara e um cabelo liso combinados com uma sexualidade moderada e restrita são necessárias para o sucesso das mulheres.

Seja ao chamar mulheres negras de morenas ou ao aceitar o “branco” como padrão, o racismo articula com a violência imposta sobre as classes desfavorecidas e encontra seu apogeu quando atua de forma machista. 

É preciso trazer todas essas nuances para o debate e trabalhar para destruir essas violências. A forma como as opressões atuam não é sempre tão óbvia, tampouco tão simplista. São necessárias uma dialética e uma visão abrangente, não polarizada, para que possamos transformar nossa cultura e conquistar a dignidade que é usurpada de tantas mulheres.

Jarid Arraes é educadora sexual, feminista e escreve no Mulher Dialética e no Guia Erógeno.