RIO - A existência de um bairro chamado Quilombo, mas povoado por brancos de aspecto e hábitos europeus, sempre intrigou tanto Renata Lima que ela levou o assunto para a faculdade de História e transformou a localidade de Casimiro de Abreu em objeto de estudo.
O assunto foi tema de seu trabalho de conclusão de curso durante a graduação, mas a pesquisa continuou no mestrado, defendido na UFF há um ano. Em um trabalho minucioso, que agora dará origem a um livro, ela descobriu que a área fora cedida pelo imperador Dom Pedro II a imigrantes suíços, que dizimaram os quilombolas e seus descendentes.
Nos períodos mais populosos, o Quilombo chegou a ter cerca de três mil moradores. A localização do bairro, afastado da sede do município, e o bom solo, tornaram-no uma área destinada à produção agrícola. Renata lamenta que a influência da cultura africana seja tão desconhecida pela população da cidade. Na pesquisa, ela encontrou um documento em que descendentes dos imigrantes propõem medidas para minimizar a importância da influência africana na constituição do município. De acordo com a estudiosa, os primeiros conflitos entre quilombolas e suíços datam de 1823:
— Os suíços dizimaram famílias inteiras de africanos. Encontrei até um mapa revelando que os europeus queriam transformar o distrito onde está o Quilombo em Nova Suíça, negando por completo o papel dos escravos e de seus descendentes em nossa sociedade.
Os poucos descendentes de quilombolas vivos ainda sofrem com as lembranças. O aposentado Alci Silva tem, pelas contas da própria família, 103 anos. Ele nasceu e cresceu no Quilombo, de onde, ao lado dos outros últimos sete moradores, foi expulso. Mas, antes de fazer as malas, conquistou o coração de uma filha de suíços, com quem teve três filhos. Lúcido, atualmente ele mora a 40 minutos do bairro, ao qual preferiu não retornar para não sofrer.
— A terra era muito boa para o plantio de trigo e de aipim. Trabalhávamos duro, mas era bom viver lá. Não tenho ressentimentos, apenas saudade — garante.
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