‘Eu sou da época em que se comemorava o 13 de maio’,
ouvi de uma professora de Antropologia da PUC - Rio esta semana. Achei isso
triste e interessante. Nunca tive isso no colégio. Hoje em dia, se comemora
mais o Dia da Consciência em todo 20 de novembro do que a data em que a
escravidão negra supostamente terminou. Afinal, essa liberdade é, e deve ser
muito questionada até hoje. Mesmo assim, é raro ver quem fale sobre isso fora
do mundo acadêmico. Brasileiro nunca soube lidar muito bem com traumas do
passado. O racismo é um e o assunto é muito feio.
Sim, racismo é feio, mas parece que, por aqui,
apontá-lo é mais feio ainda. Se você cisma de falar sobre isso, corre o risco
de te pedirem para bater na boca e tudo. No Brasil, é um assunto tão incômodo que
nem deve ser mencionado, finge-se que não existiu da forma que existiu ou pedem
para “deixar para lá”. Essa última é a preferível.
Há uns quatro meses, eu estava com minha namorada em
um restaurante de temática colonial em Botafogo e, mais uma vez, pude constatar
isso. O lugar, muito bom, é um dos únicos pela Zona Sul que não chegou ainda a
preços surrealmente absurdos, mas já havíamos sido alertados por uma amiga dela
sobre a decoração tida como “duvidosa” do local.
Mesmo tendo ido ao restaurante algumas vezes, nunca
havíamos nos deparado com nada de mau gosto por lá (se todo estabelecimento de
temática colonial fosse abordado assim, teriam que fechar inúmeros lugares).
Porém, nessa última vez, notamos que um quadro ilustrava explicitamente um
leilão de escravos, com um homem branco de postura senhoril segurando um
péssimo “menu” com o preço dos negros melancólicos e acorrentados aos seus pés.
O restaurante, devidamente informado via Serviço de
Atendimento ao Consumidor sobre o péssimo gosto do quadro e o nosso incômodo
por aquela atrocidade estar sendo usada como decoração, nem ao menos enviou um
pedido de desculpas ou deu qualquer outra forma de retratação. Assim, o quadro
permanece lá para quem quiser ver e naturalizar o holocausto negro que foi
oficialmente extinto há 125 anos.
O racismo no Brasil é exatamente isso: um quadro na
parede de nossa história que, apesar de tão feio, faz parte do cenário há tanto
tempo que não querem sequer tocar nele. Assim, falar sobre ele e pedir pela sua
retirada é muito problemático, já que todos se acostumaram com ele ali compondo
o ambiente.
Afinal, quem ele incomoda?
Fonte: Jornal O Dia de 16/05/2013, colunista Gilberto
Porcidonio, jornalista e mantém o site otitere.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário