Marcelo Silles
A rejeição por parte dos homens
pretos brasileiros as mulheres pretas brasileiras, é algo que intriga e
manifesta um sentimento repulsivo a tudo que representa a cultura do
clareamento.
Os negros brasileiros das cenas
do pagode-futebol com seus rígidos corpos torneados esbeltamente, com a pele
negra bem tratada e lisa, a qual os mesmos as esculpem para atraírem as fêmeas
brancas e, de preferência tom de neve, desfilam pelas ruas como se fossem reis,
imperadores da sexualidade prontos para expelirem suas sementes da
procriação. Não é raro vê em Bom Jesus
do Itabapoana-RJ, os homens negros com suas parceiras pretas as tratando de
forma machista e vil. As mulheres pretas, na atual conjuntura familiar continua
como a maioria de mães solteiras em nossa sociedade. E ainda como a maioria com
mais filhos.
Em tempos em que, muitos por aí
ficam latindo que somos apenas uma raça, humana, porque a mulher negra
brasileira ainda ocupa a pior posição na pirâmide social?
Desde que, os homens preferem as
loiras, um preto afirmar que prefere as pretas corre o sério risco de ser
tachado de racista e que tal comportamento é um racismo às avessas. Isso ocorre
freqüentemente comigo em Bom Jesus do Itabapoana-RJ. Mas pérai, porque pode-se
dizer de peito estufado e com sorriso largo que os homens em geral preferem as
loiras, morenas e quando um preto diz que prefere as pretas é classificado de racista?
Particularmente por algumas
pessoas, sou chamado de radical, isso é bom porque significa que tenho raízes,
e que quero dividir o país em raças. Como dividir o que sempre esteve dividido?
Onde se materializa a idéia de
uno, cortando assim o cordão umbilical da identidade ancestral de cada ser, o
buraco é muito embaixo, lá no fundão mesmo. Se somos apenas um, pra que tenho
que vasculhar o meu passado? O engraçado que para os descendentes europeus, os
seus passados sempre são presentes e futuro. Quando um preto começa a esmiuçar
suas origens, chegando a lógica de sua existência, rapidamente a sua voz é
calada, sua boca é amordaçada e seu discurso amputado junto as suas raízes. A
cronologia preta é negada até a morte por aqueles que têm medo e pelos
interessados em não remoer feridas, trazer a tona crimes, brutalidades,
genocídios.
“Durante quase cem anos, os
estudos que analisaram o negro no Brasil, se não o viam como destituído de
tudo, viam no como mercadoria, que no limite é quase a mesma coisa. Em outras palavras, o olhar era externo, mais
do que isso, era sob a ótica do colonizador, sobre tudo do traficante e do
senhor. “(BERNARDO, Teresinha Bernardo. As
Deusas na diáspora negra. 2010. p.64)
É nesse terreno vertiginoso de
disputas de iguais e não-iguais, que paira sobre nós a nuvem da intolerância
atrelada à alienação, o descompromisso e o não querer saber de alguns irmãos
pretos, que para serem aceitos ou simplesmente pregam que todos temos o mesmo
sangue, firmam pactos de agressão contra seus próprios irmãos, pois de fato é
muito mais conveniente está do lado dominante financeiramente, do que do lado
da verdade. Outrora não se discute aqui o comportamento de nossos irmãos em
aceitar a miscigenação e nem os culpar para tal contribuição, mas sim a
construção histórica de uma exclusão perpetrada quando já não se vinha mais
necessária a mão-de-obra escrava. Para criar o tal apartheid brasileiro e
controlado, foi necessário criar estereótipos negros, batizar com nomes
portugueses, criar novas vidas.
A crítica aqui feita, não se
trata de julgar e fazer semelhanças com a realidade cotidiana generalizada de
alguns indivíduos, mas resgatar e fazer com que esses indivíduos entendam as
circunstâncias simbólicas que causaram o efeito colateral nas relações
humanas-afetivas brasileiras. Tal efeito provoca no presente momento, um desejo
incansável de busca pela verdade do preto e da preta, de sua árvore
genealógica: quem eu sou de onde vim, meus ancestrais, antepassados. De que
lugar da África vim? Sendo descendente de pretos escravizados, onde aportaram,
de que senzalas? Porque os negros não tem participação na histórica fundação da
cidade de Bom Jesus do Itabapoana-RJ?
São muitas as perguntas que
ficarão sem resposta, se não houver um embate que cause desconforto entre os
cidadãos bonjesuenses que logo rebaterão que são assuntos que não mais vêem a
se preocupar no momento. Agora se
comemora a tal Feira da Providência. Porque celebramos então e lembramos da
cultura libanesa, italiana, portuguesa se no dia 20 de novembro no distrito de
Rosal na festa da Consciência Negra, não podemos celebrar da nossa forma a
nossa cultura afro, relembrar e homenagear os nossos ancestrais, a nossa
culinária corretamente como deve ser feita, nossos ritos etc. sem sermos
tratados de radicais? Muito de nossa cultura foi abstraída sem indenização. E
isso incomoda.
Bom de volta ao título-tema de
nosso texto, data venia ao Sr. Gilberto Freire, novamente discordo de sua obra
Casa Grande e Senzala a qual classifico novamente, como uma obra machista,
sexista e a culpo por ser uma das obras responsáveis pela criação dos
estereótipos feministas da mulher preta na qual a coloca na condição de objeto
e não de ser humano. Bem esse autor pode ser de renome para alguns, para mim
não. Um amigo da cidade confessou a mim que é louco para ter um caso com uma
negona, pois disseram a ele que, as mulheres negras são quentes, bem
quentinhas. O mesmo tem um relacionamento a mais de dez anos com uma mulher
branca. Vejam bem, disseram a ele. Então se disseram, não foi apenas um e sim
vários homens que apontam a mulher negra como foguenta, boa de cama, quentes,
nunca apontam-nas como mulheres dedicadas, inteligentes, lindas, esposas,
valorosas nunca com qualidades que realmente rainhas merecem ter, mais sim com
adjetivos exdrulos, machistas e racistas criados pelo homem branco durante os
séculos.
Nós homens pretos, temos que
saber respeitar, valorizar e saber a verdadeira história da mulher preta,
embrear-nos mais na diáspora, fortalecer ainda mais os nossos conhecimentos e
saberes, sairmos do comodismo da limitação e desbravar o universo preto e da
mulher preta.
Referências bibliográficas:
BERNARDO, Teresinha Bernardo. As Deusas na diáspora negra. 2010.
CAMPOS, Maria Consuelo Cunha. A
representação da mulher negra na literatura brasileira. UERJ/PEN Clube do
Brasil. 2007.
ARAÚJO, Clarice Fortunato. Porque
as mulheres negras são minorias no mercado matrimonial. XI CONLAB. 2011
EUCLIDES, Maria Simone; FIÚZA,
Ana Louise de Carvalho; PINTO, Neide Maria de Almeida; DOULA, Sheila Maria. O
sentido da liberdade para as mulheres negras: Discussão necessária. XI CONLAB.
2011